A eficiência reprodutiva em vacas de corte está diretamente relacionada a condição nutricional das vacas ao parto. Assim, logo após este evento e de acordo com as condições ambientais de oferecimento de alimentos (principalmente de forragens), as vacas reunirão condições fisiológicas para manter suas atividades, para produção de leite e posterior reinício da atividade reprodutiva pós-parto.
No entanto, em muitos sistemas de produção, principalmente baseados em forragens naturais, produções em final de ciclo de pastagens de inverno e ainda mais recentemente a competição por áreas de produção com as culturas da soja e arroz, pode haver um desbalanço entre o atendimento das necessidades nutricionais das vacas e a oferta de alimentos em quantidade e qualidade. Assim, estratégias de manejo buscando reduzir a demanda de nutrientes pelas vacas de acordo com o ambiente e o sistema de produção devem ser consideradas.
Para o incremento dos resultados de eficiência reprodutiva em rebanhos de cria, o principal fator é a condição nutricional da vaca, ou seja, a matriz deve reunir reservas de energia na forma de gordura para garantir a produção de leite para o terneiro e recuperação pós-parto para assim poder retomar a ciclicidade pós-parto e adequada fertilidade. Esta condição nutricional desejada é verificada através da condição corporal das vacas, onde em uma escala de 1 a 5 (1 uma vaca extremamente magra e 5 uma vaca extremamente gorda) é desejável que a vaca esteja com condição igual ou superior a 3 ao parto.
Contudo, quando uma vaca de corte não apresenta esta condição nutricional mínima no pós-parto recente, existem alternativas de manejo que podem ser utilizadas, de acordo com as condições de cada fazenda, desde melhorias no fornecimento de alimento para as vacas, até manejos com foco diretamente relacionado ao terneiro.
Desmame precoce
O momento de desmame tradicionalmente realizado em vacas de corte se dá em um período entre 180 e 210 dias de idade do terneiro. Teoricamente as propriedades bem equilibradas em termos de condições de fornecimento de alimentos às vacas durante a lactação, suprindo assim as necessidades dessas, apresentam satisfatórias taxas de prenhez, sendo capazes de desmamar animais com pesos médios acima dos 180kg. No entanto, em situações onde estes resultados não são possíveis de serem atingidos seja de uma forma recorrente ou em virtude de algum desajuste na oferta de alimento às vacas por questões ambientais (inverno prolongado ou seca no verão) existe a necessidade de realização de alguma intervenção na mamada, visando a redução no desgaste e estresse da matriz e uma resposta maior no desempenho reprodutivo desta.
O desmame precoce pode ser caracterizado como a separação do terneiro da vaca entre os 70 e 90 dias de idade. Os principais objetivos desta técnica são a redução da demanda por nutrientes da matriz e consequentemente melhora na sua condição nutricional, bem como a redução na interferência de uma forma negativa da presença do terneiro sobre o eixo reprodutivo da vaca. A associação destes dois fatores principais acaba por antecipar o retorno à ciclicidade da vaca com cios mais férteis e mais cedo dentro do período de acasalamento, como também por um potencial aumento na fertilidade nos protocolos de IATF.
Como resultados práticos do efeito do desmame precoce e o impacto na eficiência reprodutiva, foi realizado um acompanhamento por nossa equipe em uma fazenda na região sul do RS por três anos consecutivos. O rebanho teve em média 84 vacas primíparas por ano da raça Braford de 36 meses de idade e apresentou como resultado médio uma elevação de 55 pontos percentuais de incremento na taxa de prenhez, saindo de 20% no primeiro ano sem o desmame precoce e finalizando no último 75% de gestação.
Contudo, ainda existem alguns gargalos e até estigmas para a adoção total desta técnica. O principal desafio é em relação ao custo, seja pelo valor das rações comerciais disponíveis no mercado e/ou outras fontes alternativas de alimento para os terneiros desmamados. Com isso, deve-se atentar bem e fazer as contas considerando-se a viabilidade econômica da adoção da técnica e o retorno financeiro. Há uma variação muito grande entre anos, onde o valor do terneiro e da matéria prima das rações acabam por determinar diretamente o retorno financeiro da implementação do desmame precoce. Em muitos casos, uma possibilidade mais equilibrada e muito utilizada é a priorização de categorias do rebanho de fêmeas, onde as vacas mais jovens (primíparas e até secundíparas) são as principais candidatas a serem desmamadas precocemente.
Outro fator importante é o mercado de compra e venda de animais. Produtores especializados em cria, que fazem a comercialização dos terneiros no desmame (final do verão até o meio do outono), acabam muitas vezes tendo que negociar os animais de desmame precoce a preços inferiores, o que torna mais difícil de fechar a conta. Porém, diversos trabalhos já demonstraram que os animais desmamados precocemente recebendo uma boa condição nutricional durante a recria e terminação, desempenham muito bem, com ganhos de pesos similares aos animais desmamados com seis ou sete meses, atingindo a puberdade na mesma idade ou inclusive de forma antecipada, apresentando características de carcaça iguais ou, em alguns estudos, até mesmo superiores em alguns aspectos específicos. Desta forma, para fazendas de ciclo completo esta prática de manejo acaba por se diluir ao longo do tempo e quando as fêmeas entram em reprodução ou os machos são vendidos para o abate, é imperceptível a diferença entre animais quanto a idade de desmame.
Um último fator importante para ser considerado para a adoção da técnica de desmame precoce é disponibilidade de mão-de-obra e estrutura da fazenda. Geralmente o preconizado é que o terneiro que irá passar pelo desmame precoce receba 1% do peso vivo de suplemento concentrado mais uma boa oferta de pasto de boa qualidade. Além disso, são necessárias revisões diárias nos animais, um maior controle sanitário do que em terneiros da mesma idade em sistema de desmame convencional.
Creep-feeding
O creep-feeding também pode ser considerado uma ferramenta de redução do efeito da mamada em rebanhos de cria. É um manejo que consiste na oferta de alimento específico para os terneiros através de um cocho privativo, no qual as vacas acabam por não ter acesso. Em muitos casos, este cocho destinado aos terneiros é acompanhado de um outro destinado as vacas que podem assim receber também alguma suplementação específica.
O principal objetivo da utilização deste manejo é o incremento no ganho de peso dos terneiros, acelerando o seu desenvolvimento, permitindo a obtenção de animais mais pesados no momento do desmame completo aos seis ou sete meses de idade. Além disso, o creep-feeding permite a oferta de suplementos e/ou nutrientes específicos (vitaminas, minerais) para os animais, além de acostumar os terneiros com o recebimento de alimento em cochos, o que pode ser um diferencial importante quando estes são encaminhados para sistemas de produção mais intensivos após o desmame (confinamento, semi-confinamento ou navio de exportação).
A relação da utilização do creep-feeding com uma melhora na eficiência reprodutiva das vacas de corte ainda precisa de maiores esclarecimentos e, com certeza, não teria o mesmo impacto positivo do que o desmame precoce tem. Existe uma hipótese que uma oferta a vontade de suplemento concentrado para os terneiros, estes reduziriam as suas frequências de mamadas o que reduzira os efeitos negativos destas interações com o eixo reprodutivo das suas mães, permitindo um maior retorno à ciclicidade destas vacas de corte. No entanto, este argumento ainda necessita de maior comprovação científica, bem como geralmente o momento em que a maioria das fazendas iniciam a prática do creep-feeding se dá após os 100 dias de idade dos animais, já no final da estação reprodutiva ou mesmo após o término desta.
Uma relação maior entre a utilização do creep-feeding e eficiência reprodutiva parece estar mais próxima ao considerarmos a puberdade como referencial. Assim, terneiras com ritmo de crescimento acelerado pela suplementação recebida no creep-feeding, mantendo ganhos de pesos similares durante a recria, podem atingir a puberdade mais cedo. Esta puberdade mais precoce pode significar uma concepção antecipada no período de acasalamento, parição mais cedo e assim uma eficiência reprodutiva melhor quando primíparas.
Quando considerar empregar uma das práticas de manejo?
Desmame precoce:
- Quando as vacas apresentam condição corporal ao parto < 3,0 (escala de 1 a 5);
- Escassez de forragens próximo a época de acasalamento, risco de seca prolongada no verão;
- Priorizar primíparas;
- Mercado favorável para a venda futura do terneiro ou se tratando de uma fazenda de ciclo completo;
Creep-feeding:
- Acelerar o ganho de peso e desenvolvimento dos terneiros;
- Encaminhamento direto dos animais para sistemas intensivos de recria/terminação;
- Valorização de animais acostumados a receberem dieta no cocho.
Cássio C. Brauner – Prof. Associado Departamento de Zootecnia – FAEM – UFPel
Eduardo Schmitt – Prof. Adjunto Departamento de Clínicas Veterinárias – FAVET – UFPel
Philipe Moriel – Professor Associado – Range Cattle Research & Education Center – University of Florida
NUPEEC HUB UFPel – Núcleo de Pesquisa Ensino e Extensão em Pecuária da Universidade Federal de Pelotas/RS.
Artigo publicado na Edição 13 da Revista PecuariaSul
