Alguns meses atrás tivemos a oportunidade de conhecer o empresário Daniel Bahr e contarmos na edição 08 da Revista PecuariaSul (outubro/novembro 2022), um pouco do trabalho desenvolvido na Fazenda Cristal, em Cristal/RS, numa matéria muito comentada entre nossos leitores. Ainda nesta primeira visita, que ocorreu no final do último outono, combinamos que seria importante que voltássemos em alguns meses, adequando-nos a melhor época, para conhecermos o sistema de produção de pastagem de verão irrigada em funcionamento. Nesta época não imaginávamos como seria importante falar sobre irrigação nesta primeira edição do ano de 2023.

Portanto, começaremos este artigo recomendando a leitura da primeira parte, na edição 08. Para quem não assina a versão impressa é só acessar www.pecuariasul.com.br e baixar a edição em pdf. É totalmente gratuito. Você pode baixar e salvar nossas edições para ler quando quiser.

De volta ao assunto, precisamos situar nosso leitor sobre do que estamos realmente falando neste artigo. Trata-se de um projeto, implantado a três anos atrás que funciona com recria e engorda de novilhos e novilhas sobre pastagem irrigada, numa área de 34,5 hectares, dividida em módulos que proporcionam a rotação dos animais e o manejo do pasto.

A ESCOLHA DO PASTO

Num projeto como este, grande parte das escolhas estão atreladas ao desempenho. Com o pasto não é diferente. É necessário encontrar a espécie e variedade que melhor responde em termos de produtividade ao manejo proposto, ao clima, tipo de solo e demais variáveis locais.

Depois de muito estudo e assessoramento técnico optou-se pela implantação da pastagem perene Jiggs, por melhor atender aos requisitos mencionados. O capim Jiggs (Cynodon dactylon) é uma variedade de grama Bermuda que se destaca pela qualidade e palatabilidade do material produzido, pois possui talos mais finos quando comparamos aos Tiftons por exemplo. Lembrando que na Fazenda Cristal, o ganho por animal precisa ser conciliado com o ganho por área, porque os animais precisam estar prontos de acordo com o cronograma e necessidade estratégica das lojas de carnes.

Atualmente a pastagem está sendo utilizada com a categoria de recria, onde se consegue maior lotação e eficiência de pastejo. Os animais entram na faixa de 250kg e saem com 350kg para outra pastagem de milheto ou de aveia/azevém, dependendo da época, para terminação.

Outro ponto importante e que justifica ainda mais a utilização do Jiggs com a categoria de recria (animais exigem mais proteína que na terminação) é que com o manejo dado a pastagem neste sistema é possível trabalhar com uma estimativa de proteína sempre acima dos 18% na matéria seca desta pastagem.

IRRIGAÇÃO COM ASPERSORES

O projeto de irrigação por aspersores da Fazenda Cristal foi desenvolvido e instalado pela AQUASOLO, uma empresa sediada no município de São José do Cedro, no oeste catarinense. Vale ressaltar a experiência desta empresa que foi fundada em 2008 e está completando 15 anos de atuação no planejamento, instalação e suporte técnico de projetos de irrigação.

Apesar disso, o funcionamento da irrigação no dia a dia é bastante simplificado e pode ser operado até mesmo pelo telefone celular, num aplicativo que permite o acionamento por setor, programação de horário e quantidade de água e todas as funcionalidades que a estrutura de irrigação oferece.

A estrutura é robusta e exige pouca manutenção. A tubulação fica quase toda enterrada e permite o trânsito de máquinas. A parte da tubulação que fica exposta é apenas a que dá suporte aos aspersores, que ficam sustentados por estacas numa altura suficiente para que os animais não encostem ou danifiquem o equipamento.

MANEJO EM MÓDULOS

A área total irrigada é de 34,5 hectares, dividida em 6 módulos de manejo. Cada módulo possui 18 piquetes de 0,3 ha e conta com uma praça de alimentação com comedouro, bebedouro e sombra, seja ela natural ou com sombrites.

A carga animal do sistema varia conforme necessidade de ajuste, mas para que se tenha uma ideia, durante nossa visita estavam instalados 385 animais pastando em manejo rotacionado de alta densidade. Estes animais são divididos por módulo (entre 60 e 65 cabeças) e permanecem um dia em cada piquete, retornando 18 dias depois ao ponto de origem.

Como nos disse Daniel, “ 0,3 ha para 60 animais pode parecer pequeno, mas você olha e vê muita comida pra esse gado, eles não comem tudo no dia, sobra, o residual de pasto é alto”.

Em final de dezembro se faz uma roçada de nivelamento, para nivelar o pasto e produzir “comida nova”. Esse manejo até poderia ser feito aumentando a carga, porém, isso prejudicaria o desempenho animal priorizado.

Todas as divisões são feitas com utilização de cerca elétrica, facilitando qualquer necessidade de abrir alguma área para manejo, sem contar seu custo incomparavelmente inferior.

ADUBAÇÃO E SUPLEMENTAÇÃO

Duas vezes por semana é feita a aplicação de nitrogênio nos piquetes que foram pastejados, com o objetivo de maximizar os resultados produtivos do sistema. O volume aplicado fica em torno dos 150 Kg de ureia/ha/mês. Além disso, são realizadas rotinas anuais de análises para verificar a necessidade de fósforo, potássio ou mesmo de calcário que são aplicados geralmente antes do início da utilização do sistema.

É necessário entendermos que tudo é muito dinâmico num sistema como esse e as medições frequentes de crescimento do pasto e de desempenho animal devem acompanhar os resultados projetados por período. Geralmente este ajuste é feito com o aumento ou redução do volume de nitrogênio aplicado.

No mesmo contexto de se maximizar o desempenho animal, a suplementação mineral energética fica disponível para os animais em comedouros de autoconsumo nas praças de alimentação. O consumo médio está girando em torno de 0,2% do peso vivo de suplemento por dia.

RESULTADOS

A cada ano que passa, os resultados obtidos vêm superando as expectativas, numa curva ascendente de desempenho. Existem explicações lógicas para isso, onde a própria curva de aprendizado tem seu peso. Além disso, a estrutura do solo vai melhorando com o tempo devido ao manejo de adubação e de pastejo de alta densidade.

A carga animal projetada de 2.500 Kg de PV/ha vem sendo aumentada com picos de até 4.000 Kg, assim como o período de utilização da pastagem que chegou a 310 dias no ano passado, frente a um projetado de 210 dias. O ganho médio dos animais (recria) está em torno das 800 gramas de peso vivo por dia, com um custo de diária ao redor de 150 gramas, evidenciando-se a rentabilidade do projeto. A mão de obra fica a cargo de apenas um funcionário que realiza tranquilamente toda a rotina do sistema.

CÍRCULO VIRTUOSO DE INVESTIMENTOS

Quando se decide investir num projeto como este, é necessário ter consciência da amplitude deste investimento. Vivemos os altos e baixos da produção pecuária e dos valores dos insumos e por isso, sempre levamos em conta a sustentabilidade no negócio em questão. Porém, quando avaliamos os dados, podemos notar o alto percentual de retorno sobre o capital investido. Trata-se de um “círculo virtuoso”, onde cada passo pressupõe o passo seguinte. Na prática, significa dizer que investir em irrigação traz junto a necessidade de se escolher uma pastagem produtiva, de adubar, de piquetear, de suplementar e de escolher os animais que deem a melhor resposta em produção de carne. Tudo isso utilizando uma coleta detalhada de dados e de gestão e ajustes constantes.

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