Sempre que falamos sobre raças bovinas, seja no meio técnico, acadêmico ou mesmo no ambiente rural, percebemos que a argumentação quase sempre tem a ver com o gosto ou mesmo a paixão motivada pela experiência com a criação de determinada raça. Além disso, o marketing envolvido também é um importante motivador junto ao mercado, e é natural que seja assim.
Analisando de maneira mais técnica, podemos afirmar que todas as raças apresentam pontos a serem melhorados e é neste momento que deixamos de discutir sobre raças para discutirmos sobre genética e sua evolução.
UM POUCO DA HISTÓRIA
O Charolês é uma raça originária da França, mais especificamente do Distrito de Charolles. Foi reconhecido em 1770 como uma raça pura, sendo uma das raças europeias mais antigas. Inicialmente era utilizado como animal de tração devido às suas características de força, rusticidade e docilidade, qualidades que permanecem destacadas até hoje nos animais, facilitando o manejo e adaptabilidade a condições adversas de ambiente.
Durante o século XIX foram realizados cruzamentos com a raça Shorthorn branco e a partir daí começou a ser selecionado com ênfase na produção de carne, que se configurou como sua grande característica. No Brasil, o Charolês foi introduzido em 1884 e teve grande desenvolvimento, principalmente entre os anos de 1970 e 1990.
Atualmente, o Charolês é sinônimo de produção de carne, sendo encontrado em todos os continentes, ajudando a construir bons resultados nos mais diversos e desafiadores ambientes.
O CHAROLÊS NOS EUA
Mesmo sabendo de sua origem europeia, podemos afirmar que a grande evolução genética do Charolês ocorreu e continua ocorrendo, no Estados Unidos. A pecuária de corte americana é dona dos mais altos índices de produtividade do mundo, com um desfrute (toneladas de carne produzidas em relação ao número total de animais) cerca de 2,5 vezes maior que o brasileiro.
É certo que a matriz produtiva americana, baseada em confinamento, não serve como comparação com nosso modelo predominantemente a pasto. Porém, gostaríamos de destacar que todo o sistema de alta produtividade deixa um rastro a ser seguido e exporta grande parte de seus sucessos para serem adaptados em ambientes que buscam melhorar seus indicadores.
Atualmente, nos EUA, se observa que o grande mérito do Charolês está no rendimento dos cortes.
Quando utilizado em cruzamentos com outras raças como Angus e Hereford, o produto final é uma carne de alta qualidade, com marmoreio adequado e com alto rendimento de corte aproveitável na carcaça, diminuindo significativamente o desperdício para a indústria.
É preciso deixar claro de que não se trata apenas de aumentar o rendimento de carcaça, mas também, de aumentar o rendimento dos cortes desta carcaça. A conta no frigorífico americano é bastante simples, onde se calcula custos semelhantes para processar carcaças de 250 ou de 450 Kg. Porém, é importante que essa carcaça pesada mantenha uma boa relação entre o tamanho dos cortes e a gordura necessária para o acabamento, para que de fato ocorra redução do desperdício com o excesso de gordura.
ONDE TEM FUMAÇA… TEM CHAROLÊS
Quando pensamos em desempenho, sabemos que os cruzamentos bem direcionados geralmente nos entregam resultados superiores aos que normalmente encontramos nas raças puras e isso se deve a famosa heterose ou vigor híbrido, assunto que trouxemos na edição 05 da Revista PecuariaSul.
Na prática, consideramos que um dos grandes exemplos de alta expressão de heterose está num terneiro fumaça. Temos a certeza de que muitos aqui já puderam testemunhar a superioridade no desempenho deste animal, fruto do cruzamento entre as raças Charolês e Angus. Esta superioridade se traduz em animais mais pesados a desmama, com maior peso e rendimento de carcaça ao abate, além do maior rendimento também na desossa.
A genética Charolês está consolidada como uma das bases dos cruzamentos industriais de países como EUA, Canadá e Austrália, onde a sustentabilidade da pecuária necessita da máxima produção de carne por animal abatido. Daí o maior desfrute observado nos sistemas de produção destes países.
UM NOVO CHAROLÊS NO BRASIL
A trajetória da raça Charolês no Brasil precisaria de muitas páginas para ser corretamente contada. São muitos anos de melhoramento e investimento de pecuaristas dedicados a raça, em sua grande parte no sul do país. Foram décadas de grandes leilões e acúmulo de recordes em exposições como a Expointer (Esteio/RS), somente como exemplo.
Com o passar dos anos, a pecuária brasileira seguiu seu caminho na busca por animais com menor tamanho adulto (frame). Muito disso ocorreu pelo deslocamento da pecuária para áreas de menor potencial agrícola, onde animais com menor necessidade de mantença, tendem a desempenhar melhor, principalmente sob os aspectos reprodutivos. No entanto, este mesmo caminho indicado pela pecuária moderna, ajudou a definir os rumos da evolução genética do Charolês.
Nos últimos 20 anos, os grandes animais de genética francesa vêm dando espaço para animais de tamanho moderado, oriundos principalmente da genética norte-americana, impactando drasticamente na melhora de indicadores como habilidade materna, facilidade de parto, funcionalidade e eficiência a campo, sem perder sua vocação de produzir animais de alta capacidade de ganho de peso e de elevado rendimento de carcaça no abate.
O novo Charolês é um animal muito mais compacto e cilíndrico do que seus ancestrais de algumas décadas atrás. Também podemos observar animais de pelagem mais curta, característica muito desejável relacionada a uma maior resistência aos ectoparasitas.
A seleção da raça Charolês segue focada nas exigências do mercado, de olho nas necessidades dos pecuaristas na busca por produtividade, melhorando o desempenho na indústria e principalmente, atendendo a consumidores cada vez mais exigentes no que se refere a qualidade da carne.
Texto: Equipe Revista PecuariaSul